Continuação da análise da folha - Gráfico 10.21

* efeitos que vão longe...

Política de Recursos Humanos (RH)
  
Uma das maiores diferenças entre a gestão na iniciativa privada e a gestão pública é que nesta última, os graus de liberdade para lidar om recursos humanos são muito menores do que no caso da iniciativa privada. Uma decisão, por menor e simples que possa parecer dentro de uma sessão do conselho universitário, traz reflexos, impactos, consequências que se estendem por décadas. E o grande erro que cometemos, é analisar cada decisão pontualmente, sem termos clareza do todo. Desta forma, tal imagem se torna um mosaico sem harmonia e difícil de operar.
Uma política de recursos humanos (RH) deve ser clara. Estabelecer nichos de prioridade e a forma de operação de cada um. Um exemplo claro de política de RH é a realizada por uma conhecida multinacional de fastfood que emprega milhares de jovens e não raramente, é sua opção de primeiro emprego. A altíssima rotatividade é algo, por eles, esperado. Por isso mesmo, sabendo que seu nicho é este, investe pesado em treinamento e na capilarização do modus operandi da empresa de forma rápida, simples e efetiva. Não significa que sua política se aplique a outras empresas, mas para ela, está adequada e atende à sua missão e visão. Outra empresa multinacional que conheci quase funciona como uma estatal: valoriza o funcionário em uma carreira de muito longo prazo e, para isto, trabalha igualmente uma carreira longa, com atrativos suficientes para a retenção de talentos. Nesta empresa, não é raro encontrar pessoas com 35, 40 anos de casa. Já em outra empresa, conheci a clara estratégia agressiva de atrair e reter os melhores do mercado de trabalho e, consequentemente, o plano de carreira tem que ser atraente para trazer mesmo o colaborador sênior e mais bem reconhecido da área, num ambiente competitivo.
Apesar da importância de uma política de RH ser clara entre empresas, no setor público, ela é quase ignorada. “A despeito da importância de servidores públicos no processo de geração e fornecimento de bens e serviços públicos, avançamos muito pouco – ou quase nada – em políticas de recursos humanos que visassem contratações claramente definidas com critérios e métricas alinhadas à gestão universitária. A definição do perfil necessário dos postos de trabalho, bem como proposição de concursos mais adequados para atração desse perfil, são medidas essenciais para contrapor estratégias de reposição automática, como foi o caso da Unicamp. Vale ressaltar que a preocupação com a profissionalização da gestão pública não é somente em imperativo financeiro, mas também o efeito salutar que profissionais qualificados trazem na qualidade do trabalho desenvolvido, incorporando e propondo cada vez mais melhorias nos processos de trabalho da organização.” Trecho do artigo em preparação do projeto Métricas de Desempenho (edição do Prof. Jacques Marcovitch).

Apesar de ter havido, no caso dos docentes, um incentivo claro de excelência e vanguarda embutidos em projetos que vieram a aumentar a produtividade dos mesmos, como o projeto Qualidade (gestão do Prof. Vogt), não temos projetos que façam algo similar para incentivar as equipes de apoio, com foco nas atividades de apoio.
Desta forma, as políticas sobre servidores que fazem a atividade, ainda sofrem ações de interesses do momento, mais do que de um planejamento no longo prazo. E um exemplo de fato gerado por esses interesses do momento está refletido no gráfico 10.21.


Gráfico 10.21- Degrau e mudança de regime



Cabe explicitar que NÃO vou entrar aqui no juízo de valor da mudança realizada, muito menos das pessoas que foram beneficiadas pela medida, mas cabe somente discutir os impactos da ação que, como descrito anteriormente, serão sentidas por décadas na Universidade.
Quando a postagem de 24 de maio mostrou o degrau entre 2013 e 2014 na figura 10.21, muitos me perguntaram o porquê. Esse degrau ocorreu devido a mudança de regime de servidores CLT ao regime estatutário, através de decisão do conselho universitário. Tal mudança traz consequências fortes em todos os demais gráficos mostrados na Postagem de 24 de maio, ao longo do tempo.
A matéria é polêmica e muito complexa. Tanto que o julgamento da mesma se encontra no STF, Supremo Tribunal Federal, anos após a mudança.
Em 2013, mais de dois mil funcionários (de um universo aproximado de cerca de 7500), foram migrados do regime celetista ao Esunicamp. Na época, as informações prestadas ao conselho universitário eram embasadas na “economia” gerada pela cessação de recolhimentos de encargos CLT desses servidores.
Figura 1, Quadro apresentado à época, sobre a suposta economia da mudança de regime.



Algum tempo depois, muitos conselheiros se manifestaram contrários e preocupados com o impacto da medida, tendo publicado em suas páginas, análises e textos sobre o assunto (http://www.dt.fee.unicamp.br/~geromel/).
O fato é que, passados 6 anos da medida, notamos os efeitos duradouros dela, em vários aspectos:
O primeiro deles, é a velocidade de subida da curva do gráfico 10.14. Os novos dois mil servidores estatutários pertenciam a um cluster na qual os colaboradores possuíam à época da medida, de 25 a 27 anos de casa.  Esse novo grupo passa a permanecer em nossa folha mesmo após a aposentadoria. Fato que reverte a suposta economia temporária com a cessação do recolhimento de encargos CLT.
O segundo efeito, é que uma grande maioria desses funcionários são/eram extremamente importantes para a Universidade. Ocupam(vam) postos de liderança e eram chave para muitos dos processos internos de administração. O caráter controverso da matéria e o potencial litígio sobre o julgamento de tal mudança fez com que esses bons funcionários acelerassem sua decisão de se aposentarem, mesmo que sua intenção pessoal e de planejamento não contemplassem uma decisão tão prematura. A recomendação de seus advogados pessoais de que a aposentadoria seria uma espécie de garantia da mudança realizada fez com que a corrida às solicitações de aposentadoria se intensificasse.
O terceiro deles, é que criou, novamente, uma assimetria entre os demais celetistas que existem na Universidade e muitos acharam que poderiam/deveriam trilhar o mesmo caminho. Por outro lado, alguns estatutários se ressentiram desta decisão pois não julgavam correto que um grupo tenha tido as vantagens da CLT, tal como o FGTS (fundo de Garantia por Tempo de Serviço) ao longo de 25 anos na carreira, para depois se aposentarem integralmente no regime próprio. Novamente, esta foi uma ação aprovada em conselho universitário, e que, ainda que tenha sido realizada sob controversas informações financeiras e jurídicas fornecidas à época, traz efeitos de muito longo prazo na Universidade.
Esse assunto aguarda a decisão do STF e, neste ínterim, muitos dos agraciados têm grande expectativa de seu tempo de aposentar chegar logo, numa suposta garantia (particularmente não sei se garante) de seu novo regime de trabalho.

Mensagem final 

É importante salientar que não nos cabe condenar quem foi beneficiado pela medida. Não é essa a intenção desta postagem, pois dentro da discussão de direitos e legalidade, a decisão final foi do CONSU, e esta situação tem trazido muita angústia a vários envolvidos. Não podemos julgar esses servidores, uma vez que estão procurando desfrutar daquilo que lhes foi oferecido como “política momentânea de RH”. 
O alerta que fica é sobre: 1) a falta dessa política clara de RH, que causa desgaste, uma perda enorme de tempo e energia, trazendo a insatisfação nas pessoas e 2) as decisões que são tomadas, sem se olhar o impacto a longo prazo, e muito além dos meses de uma gestão, ou de um apoio em votação a uma ou outra chapa reitoral, têm efeitos intensos nas vidas e saúde das pessoas e da instituição.

Um outro assunto polêmico que desperta o gráfico 10.12 é também a análise da proporção docentes x funcionários. Há discussões e dúvidas de qual seria o número ideal desta proporção. Dentro do conselho universitário, não raramente se observam discussões que beiram à luta de classes. Há conselheiros que promovem, claramente, o embate de uma carreira versus outras, muitas vezes guiados pelo interesse na exploração partidária desses nichos. Para esses grupos, muito mais interessam a preservação quantitativa de seu “curral eleitoral” e, nesse contexto, novamente, a missão primordial da instituição é deixada em planos inferiores. Mas este assunto, traremos de volta em futuras postagens, em conjunto com a análise do gráfico 11.2.



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